Mato Grosso tem se firmado como um dos principais destinos do país e do mundo para a observação de aves. A diversidade de espécies que habitam os três biomas do estado (Amazônia, Cerrado e Pantanal) tem atraído turistas estrangeiros dispostos a investir em experiências de natureza que unem fotografia, ecoturismo e conservação. Segundo o guia profissional Aynore Soares Caldas, diretor executivo da Tapira Expeditions, o estado aparece entre os líderes nacionais nos rankings internacionais de birdwatching, como o Global Big Day e o October Big Day.
Aynore, que atua há mais de duas décadas como guia de turismo de vida silvestre, diz que Mato Grosso é “um território privilegiado”, justamente por reunir três ecossistemas distintos em uma única unidade federativa. “Essa diversidade faz com que, em um mesmo roteiro, o visitante possa observar aves amazônicas, espécies típicas do Cerrado e outras exclusivas do Pantanal”, explica.

O Diagnóstico de Políticas Públicas do Turismo de Observação de Aves no Brasil, lançado pelo Ministério do Turismo em setembro deste ano, confirma essa vocação. O documento cita São José do Rio Claro (a 296 km de Cuiabá), como um hotspot internacional, termo usado para áreas de alta densidade de espécies, e menciona o Projeto Revoada das Aves, da Prefeitura do Município, como uma iniciativa local de promoção do ecoturismo. A publicação britânica Female First também incluiu a cidade entre os principais destinos para observadores de aves no país.
Mesmo com o destaque, Mato Grosso está entre os 11 estados que ainda não possuem legislação ou plano específico para o turismo de observação de aves, segundo o diagnóstico. Aynore afirma que há muito espaço para o crescimento local da atividade, sobretudo com a formação de novos guias especializados. “Ainda há um potencial muito grande para os mato-grossenses que queiram se tornar guias de observação de aves”, diz.
Sobre o público

De acordo com o Censo Nacional do Turismo de Observação de Aves (TOAves, 2023), o gasto médio individual ultrapassa R$ 6 mil por viagem, sobretudo quando há guias especializados e experiências autênticas em áreas naturais. O público brasileiro é composto majoritariamente por pessoas entre 30 e 59 anos, com alta escolaridade (73%) e renda média superior a cinco salários mínimos. O levantamento indica ainda que a presença de condutores experientes e de infraestrutura adequada influencia diretamente no tempo de permanência e na satisfação dos visitantes.
Aynore conta que o interesse internacional é crescente. “Hoje, os principais visitantes são norte-americanos, canadenses, ingleses, alemães, espanhóis e franceses. E temos recebido cada vez mais turistas vindos da Ásia, especialmente da China, Índia e Vietnã”, diz. Segundo ele, muitos vêm ao estado com listas específicas de aves a serem observadas, conhecidas entre os praticantes como wish lists. “Alguns já viajaram o mundo todo. Aqui, encontram espécies únicas e uma natureza ainda preservada”.

O guia relata que já conduziu expedições com nomes reconhecidos do circuito global de birdwatching, como a australiana Carol Hedges, que subiu do 74º para o 20º lugar no ranking mundial após uma temporada com a Tapira Expeditions. “Essas experiências ajudam a colocar Mato Grosso no mapa internacional do turismo de natureza”, afirma.
Turismo como forma de preservação
Além do apelo turístico, a atividade também contribui para a conservação ambiental. Segundo Aynore, pousadas e fazendas têm transformado antigas áreas de pecuária e extração de madeira em reservas privadas abertas ao turismo de observação. Ele cita o exemplo da Jardim da Amazônia Lodge, em São José do Rio Claro, cujo proprietário abandonou o setor madeireiro para investir em ecoturismo. “É uma mudança de mentalidade. Quando a comunidade percebe que a floresta em pé gera renda, a preservação passa a fazer sentido econômico”, avalia.
O mercado de safáris e turismo de vida selvagem, segmento próximo ao de observação de aves, movimenta US$ 5,4 bilhões no Brasil e deve crescer 7,2% até 2035, segundo a consultoria Future Market Insights. Turistas estrangeiros representam cerca de 40% desse público, e mais da metade das reservas são feitas online, sinal de um setor cada vez mais digitalizado e voltado a experiências personalizadas.
Aynore ressalta, no entanto, que o crescimento do setor precisa vir acompanhado de boas práticas ambientais. Ele critica o uso excessivo de playback, que é uma técnica que reproduz sons de aves para atraí-las. “Se usado de forma irresponsável, pode causar abandono de ninhos e deixar filhotes órfãos. É preciso saber quando e como usar”, diz.

