Lauriberto Pompeu – O Globo
O relator da CPI do MST, deputado Ricardo Salles (PL-SP), e o o ministro da Agricultura, Abastecimento e Agropecuária, Carlos Fávaro, discutiram durante a sessão de hoje do colegiado sobre a posição em relação ao movimento social. Pressionado pelo relator, o ministro criticou as invasões de terra, mas fez ressalvas de que o movimento é legítimo e disse que tem amigos dentro do MST.
Durante depoimento na CPI, Salles questionou Fávaro sobre uma fala dada pelo ministro, em fevereiro, quando o chefe da pasta declarou que é preciso “acabar com o preconceito contra o MST”.
Em outro momento da sessão de hoje, o ministro da Agricultura ironizou uma declaração de Salles sobre “passar a boiada”. Salles disse isso em 2020, quando o deputado era ministro do Meio Ambiente do ex-presidente Jair Bolsonaro. Em uma reunião ministerial, Salles falava que era preciso aproveitar que a crise do coronavírus estava no foco do noticiário para viabilizar projetos de interesse do agronegócio.
O depoimento de Fávaro acontece depois de uma série de idas e vindas. Ricardo Salles chegou a reclamar que Fávaro negou o convite para participar do colegiado, mas o ministro recuou e decidiu participar.
Inicialmente, Fávaro evitou fazer críticas fortes ao MST e avaliou que os pedidos do movimento são legítimos.
– Disse que precisamos acabar com o preconceito em relação ao movimento social que queira produzir e gerar alimentos, como vi lá em Centenário do Sul (cidade do Paraná).
Depois disso, Salles reclamou e chegou a dizer que Fávaro defende invasões de terra.
– O ministro da Agricultura do Brasil, o tema mais relevante da nossa pauta econômica, entende que é legítimo o sujeito invadir terra devoluta. Não tem cabimento.
Fávaro então reagiu, voltou a defender os pedidos do MST, mas passou a falar que é contra as invasões.
– A invasão não se justifica. Eu também fui líder de classe, fui presidente de entidade de classe, às vezes para se fazer ouvir precisa fazer manifestação, isso é legítimo da democracia, é muito legítimo. Agora, dentro da ordem e da lei. Não defendo invasão de propriedade, a lei não permite.
Mesmo assim, a discussão prosseguiu e o relator da CPI criticou a posição dos deputados do PT e do PSOL e as diferenciou da condenação do ministro às invasões. A fala de Salles gerou um tumulto na comissão, com críticas dos deputados governistas.
– Que fique consignado nesta CPI que o ministro da Agricultura do PT não concorda que qualquer movimento de terra possa invadir terra devoluta. Essa posição do ministro é corroborada pela lei da regularização fundiária da qual ele foi relator – declarou Salles.
– Tem razão o ministro da Agricultura, quem está errada é a bancada do PT e do PSOL, que vem aqui falar mal de terras devolutas – completou.
Em outro momento da sessão desta quinta-feira, o ministro foi perguntado sobre o fato de João Pedro Stédile, que é líder do MST, ter dito que o “agro burro está com os dias contados” em depoimento à CPI. Fávaro defendeu o que disse Stédile e aproveitou para criticar Salles.
– Todos aqueles e deve ser isso que o João Pedro Stédile quis dizer aqui, não vi o depoimento, é esse (setor do agro) que ele se referiu como essa referência, como quem faz as coisas certas, geram emprego e oportunidade, devem continuar e geram exemplos para todos outros. Agora, aqueles que querem transgredir, que querem desmatar ilegalmente, passar a boiada, queimar, tem que ser punidos no rigor da lei.
Em resposta, Salles reclamou que Fávaro já apoiou Bolsonaro quando era senador e depois decidiu ser aliado de Lula.
– Já é a segunda vez que eu escuto o senhor dizer esse termo “passar a boiada”. Eu não tenho vergonha nenhuma de ter dito isso. Primeiro porque sou muito amigo da pecuária, acho que passar a boiada é algo muito positivo. Segundo que o senhor quando era senador cansou de ir no meu ministério da boiada fazer defesa de produtores rurais de seu estado e pedir favores para seu estado – disse.
–Não foi só no meu ministério, foi em vários em outros, está cheio de vídeo seu aqui falando do governo do Bolsonaro. O que me espanta foi o senhor fazer campanha para o Senado usando a imagem do Bolsonaro (em 2020) e depois vindo ser ministro do PT. Está fazendo gracinha com a história da boiada, tem que ouvir a verdade.
A sessão de hoje acontece em meio a um esvaziamento da CPI. Republicanos e PP, que negociam indicar ministros no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, trocaram seus membros para deputados mais alinhados ao governo.
Isso aconteceu após a CPI convocar o ministro da Casa Civil, Rui Costa, decisão que foi considerada exagerada pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que a anulou por avaliar que Costa não tem relação com as invasões do MST.
Do outro lado, a oposição tenta agora um acordo com Lira para retomar a participação dos deputados mais distantes do Palácio do Planalto.
A CPI apura atuação do MST, sobretudo em invasões de terras. As ações se intensificaram durante o Abril Vermelho, quando as invasões tradicionalmente tem um aumento. O movimento pressiona por demandas como a concessão de terra, a recriação da Superintendência do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) de Petrolina e indicações para cargos no Incra em outros estados.